URUGUAIANA JN PREVISÃO

João Eichbaum

Marrocos

Conta Antoine de Saint-Exupéry, em sua obra "Terre des Hommes", que um escravo dos mouros, no aeroporto de Juby, lhe dirigia, todas as tardes, essa breve súplica: "cache-moi dans un avion pour Marrakech"(me leva num avião para Marrakech)... "Depois disso, tendo feito o possível para sobreviver, o escravo sentava com as pernas cruzadas e preparava o meu chá". Mas não me considerava - segue o maravilhoso autor francês - um homem como ele, e sim uma força capaz de colocar em marcha qualquer coisa semelhante a um vento favorável que se levantaria um dia para mudar seu destino. Em Marrakech, onde acreditava que sua mulher e seus três filhos ainda viviam, ele tinha exercido uma missão maravilhosa: era tropeiro, tinha bois para vender, conduzia seus carneiros da planície para a montanha, e se chamava Mohammed. Um dia foi abordado por uns arábes que lhe pediram para acompanhá-los à procura de animais no sul. Enganaram-no. Aprisionaram-no e o venderam como escravo. E, como escravo, ele perdeu a identidade e o nome, passando a ser chamado simplesmente de Bark, denominação dada a todo e qualquer escravo.

Confessa o escritor Saint-Exupéry que tinha piedade daquele pobre homem, mas nada podia fazer por ele. Naquele território imperavam os dissidentes, sempre movidos pelo ódio e pela vingança. Se atendesse ao pedido do escravo, ele, Saint-Exupéry, seria alvo da vingança dos mouros.

Assim era Marrocos, um reino muçulmano pobre e relativamente isolado, que por muito tempo foi palco de dissidências e revoltas tribais. De protetorado originariamente francês que era, acabou sendo dividido secretamente com Espanha.

Marrakech, o sonho do infeliz escravo cuja história foi narrada por Saint-Exupéry, é uma bela cidade, uma das quatro cidades imperiais de Marrocos. E Marrocos é um país que, brindado pela natureza, tem como linhas divisórias o Mar Mediterrâneo de um lado e o Oceano Atlântico de outro, e pode ser considerado, poeticamente, como um oásis, que oferece ao mundo as maravilhas e mistérios do deserto de Saara.

De repente, Marrocos apareceu no palco do futebol mundial. Bateu a seleção de Portugal, com o astro Cristiano Ronaldo e outros dez, na Copa do Mundo. Países como Inglaterra, Alemanha, Espanha, Portugal e Brasil e seus astros ficaram pelo caminho, amargados pela humilhação da derrota, com a consequente eliminação no torneio, mas a muçulmana Marrocos chegou lá, onde os grandes países cristãos não conseguiram chegar.

Depois de abater Portugal, Marrocos enfrentou a França, um de seus antigos colonizadores, em disputa da qual sairia o adversário da Argentina, na finalíssima. Jogou de igual para igual com os franceses, exibindo um elenco de vários jogadores que praticam o futebol arte, aplicando desconcertantes dribles nos adversários. Só foi derrotado pelo maldito axioma futebolístico, que persegue a quem não joga sob o pálio da sorte: quem não faz, leva. Acabou perdendo também para a Croácia, porque alguns importantes jogadores não puderam atuar, em razão de lesões. Mas mostrou que, se tratando de capacidade, seu nome estará fora da lista dos desprezíveis fracassados, nessa "terra dos homens".

Ação entre amigos e inimigos Anterior

Ação entre amigos e inimigos

Qatar Próximo

Qatar

Deixe seu comentário