Nas últimas semanas, motoristas e transportadoras que operam no trajeto Uruguaiana (Brasil) e Paso de los Libres (Argentina) foram surpreendidos por duas mudanças significativas anunciadas pelo Complexo Terminal de Cargas (Cotecar), em Paso de los Libres. Além da decisão de migrar para um modelo de pagamento exclusivamente digital, está prevista uma elevação substancial no valor cobrado pelo uso do estacionamento do pátio alfandegado, conhecido como “praia”.
A obrigatoriedade do pagamento eletrônico decorre da Circular nº 3-2025, emitida pela Tesouraria Geral da Nação da Argentina. O documento determina a extinção das guias presenciais e a adoção de meios digitais, como cartão de crédito, cartão de débito ou carteira digital, para todas as operações vinculadas ao sistema e-Recauda (portal eletrônico do Governo Argentino para pagar dívidas e obrigações não tributárias com o Estado Nacional).
De acordo com o texto oficial, a mudança entra em vigor apenas em 1º de janeiro de 2026.
Reajuste
Paralelamente, o governo argentino publicou a Resolução 284/2025, que redefine os valores cobrados pelo estacionamento no Cotecar. A tarifa passa a ser vinculada ao preço do litro da gasolina de maior octanagem da Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF), a principal empresa estatal de energia da Argentina em Buenos Aires, o que na prática pode elevar a diária para cerca de US$15 por cada período de 6 horas.
Segundo a Associação Brasileira de Transportadores Internacionais (ABTI), o aumento é desproporcional diante das condições do pátio e da infraestrutura oferecida atualmente. Para a ABTI, um reajuste tão expressivo pode comprometer a competitividade da fronteira e elevar custos logísticos de maneira abrupta e sem contrapartidas.
Com a repercussão das primeiras informações, a Associação acionou o Ministério das Relações Exteriores, discutiu o tema com a Receita Federal e se reuniu com a Direção Nacional de Assuntos Técnicos de Fronteira da Argentina. Também promoveu um encontro com as empresas associadas para alinhar a avaliação técnica, jurídica e operacional dos impactos.
Durante a reunião com transportadores, a entidade apresentou a possibilidade de contestar a aplicação imediata do pagamento digital para estrangeiros, já que o texto oficial não explicita essa extensão. Além disso, o Acordo sobre Transporte Internacional Terrestre (ATIT) determina que qualquer mudança que afete operadores internacionais deve ser comunicada com antecedência mínima de seis meses, o que não ocorreu.
Outro ponto crítico é a tentativa de transferir aos motoristas a responsabilidade pelo pagamento das taxas. Para a ABTI, essa prática é inadmissível, pois a cobrança deve recair sobre as transportadoras. A Associação também alertou que o pagamento eletrônico exige documentação fiscal apropriada, algo inexistente atualmente, uma vez que o Cotecar emite apenas um ticket simples.
Durante o debate com os associados, foi criada uma mesa de trabalho destinada a mapear os principais gargalos do Cotecar, tanto na infraestrutura quanto na gestão do pátio. A partir desse levantamento, a Associação pretende defender que qualquer reajuste seja gradual, condicionado à melhorias verificáveis e limitado por um teto de aumento considerado razoável.
A pauta inclui problemas de segurança, manutenção de espaços comuns, áreas de descanso, banheiros e o funcionamento geral do complexo, questões que, segundo a entidade, precisam ser abordadas antes da aplicação de novas tarifas.
No final de novembro, a ABTI participou de uma reunião com Ignacio Ferrer, assessor do senador argentino “Peteco” Vischi, em encontro facilitado pela Receita Federal brasileira. A conversa reforçou a busca por apoio político para garantir que as cobranças no Cotecar sejam equilibradas e que a transição ao pagamento eletrônico não penalize transportadores internacionais.


