BRIANE MACHADO
Preserve a saudade
Qual é a sua maior saudade?
A restrição tomou conta de nossas vidas. Estamos à mercê de possibilidades, de bandeiras, de decretos, do bom senso que cerceia a liberdade de ir e vir.
Deixamos coisas, pessoas, hábitos de lado para dar lugar ao bem comum, coletivo. Pensamos em nós e em quem está ao lado.
Evitamos o que podemos para que, lá na frente, tenhamos motivos para sair de casa e fazer o que foi impossível por um (longo) período de afastamento.
Entretanto, paira no ar o ponto de interrogação que nunca foi antes visto por esta geração.
Ouvimos histórias dos nossos avós, bisavós, dos antepassados que vivenciaram fatos históricos que mudaram a concepção do mundo. E, com certeza, antes de vivermos essa fase que parou o mundo, não conseguíamos dimensionar o tom saudosista com que as histórias eram contadas.
Talvez, as próximas gerações não consigam compreender a gravidade da pandemia que assolou o mundo no ano de 2020. Talvez, não tenhamos palavras que consigam descrever fielmente o que foi vivenciar crises em todos os setores que compõem a organização social. Ou, ainda, não sabemos se eles irão acreditar em todos os fatos contados, como fizemos ao escutarmos as histórias que permeiam o século passado.
Hoje, vivemos à base de saudade. Desde as coisas mais simples que antes eram normais, até a nostalgia de lembrarmos de momentos com aqueles que amamos.
São situações estranhas, complicadas. Viver com tudo à disposição e saber que as pessoas que amamos estão vivas, porém, não temos a possibilidade de vê-las quando queremos.
Antes de tudo começar, eu tinha o hábito de ir à padaria no meio da tarde para comprar biscoitos salgados e café espresso. Às vezes, comprava um quindim. Eu tinha um horário certo para isso. Diariamente.
Hoje, um vírus invisível me põe a pensar se eu realmente preciso daqueles biscoitos e café no meio da tarde. Tive a certeza que o quindim é dispensável.
E esse é só um exemplo do que a invisibilidade de algo tão letal faz com o ser humano. A vida mudou por aquilo que nem temos a possibilidade de ver, de ter a certeza que está ali.
Será essa a finalidade de uma pandemia? Fazer o povo acreditar que o invisível existe? Será uma lição sobre a fé, da qual muitas vezes duvidamos?
Resiliência e adaptação são as palavras-chave para sairmos dessa sem maiores danos - sim, danos contra a vida. Na maior parte do tempo nos preocupamos com os cifrões que estamos perdendo ou deixando de adquirir, mas, não nos atentamos para as vidas que estão deixando de existir, para os sonhos que não se concretizarão, para os abraços que não serão dados, nem sentidos.
As concessões fazem parte de nós e precisamos delas para seguir em frente. Abrir mão, muitas vezes, não significa perder, mas dar uma chance para o futuro.
A saudade vai existir sempre, em qualquer circunstância e, geralmente, nos adaptamos a ela.
Precisamos viver para sentirmos.
Se preserve, preserve quem amas e seja o saudosista das próximas décadas.
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