Ricardo Peró Job
O retrocesso do livre pensar no século XXI
A onda do politicamente correto certamente é a mais importante forma de opressão ao livre pensamento do século XXI. Além de carecer de qualquer espírito de autocrítica, combate de forma primária uma visão plural do mundo. A imposição de um determinado modelo de pensamento gera um revisionismo histórico boçal, inibe a evolução intelectual, anula o espírito crítico e gera um comportamento de rebanho.
Com seu patrulhamento ideológico e apoio midiático, serve também de degrau para a projeção de líderes demagogos, populistas e tiranos, dando-lhes uma notoriedade que em um mundo de pensamento plural jamais obteriam.
O pensamento único é o pai do irracionalismo. A adesão das massas aos movimentos nazi-fascistas e comunistas na primeira metade do século passado é um triste exemplo da vitória deste modelo. A censura, o falso moralismo e o revisionismo histórico fazem parte do pensamento "politicamente correto", assim como o dos regimes políticos de opressão, causando a morte da liberdade de expressão, de opinião e da tolerância mútua. Ter opinião própria passa a ser pecado. Parecem seus seguidores, desconhecer que a humanidade só evoluiu quando passou a aceitar e tolerar mutuamente as idéias díspares, argumentando racionalmente em caso de discordâncias. Respeitando o dissenso, nos mostramos tolerantes, ao exigirmos o consenso, medíocres e intolerantes. Quando um grupo consegue impor a censura sobre idéias alheias sob o argumento de que são erradas ou ofensivas, inclusive criando punições legais para os desobedientes, está instaurada a mediocridade intelectual e a ditadura. O mais tragicômico de tudo é o fato de que os não concordam com "ordenadores de idéias" serem chamados em muitas ocasiões de fascistas pelos mesmos.
Proibir a livre manifestação de idéias a respeito de qualquer assunto é querer padronizar e homogeneizar os indivíduos, fazendo-os pensar e agir de modo uniforme, levando-os ao "comportamento de manada", matando o que nos diferencia dos demais seres vivos, a razão. Tal tipo de ditadura afeta todas as áreas, desde a ciência até as diversões públicas, mas suas principais vítimas são o humor, a cultura e as artes. Livros, filmes, peças de teatro, programas humorísticos, nada escapa da "censura" da patrulha ideológica do politicamente correto. Profissionais que atuam na área de criação, como diretores de cinema, de televisão, humoristas, atores e escritores, pisam em ovos, pois passam a lidar com um mundo onde qualquer cena, texto ou diálogo pode ser apontado como ofensa grave, deixando-os sujeitos a um linchamento moral. Como conseqüência, peças de teatro e programas humorísticos perdem o seu poder combativo, contestador, seu dom de criticar ou caricaturar. Transformam-se em verdadeiras odes à mesmice, cheias de chavões, estereótipos e palavras de ordem. Na literatura, Reinações de Narizinho, do grande escritor brasileiro Monteiro Lobato foi um das vítimas da patrulha ideológica, que conseguiu descobrir racismo no livro infantil. Filmes antigos e clássicos, como por exemplo, "E Vento Levou", também foram retirados de serviços de "streaming", acusados de apologia ao racismo. Até mesmo bandas de rock norte-americanas mudaram de nome para ocultar palavras que tinham ligação com o passado confederado do sul do país. O Estado do Mississipi retirou o símbolo confederado de sua bandeira, apagando parte de seu passado. Estátuas de vultos históricos foram derrubadas ou vandalizadas na Europa, Brasil e EUA, numa tentativa patética de apagar a história e modular o pensamento, os usos e costumes de séculos passados à realidade atual de New York, Paris, Oslo e Ipanema.
Parece incrível que mais de trinta anos do fim da ditadura militar, no Brasil de hoje, graças à praga do politicamente correto estejamos sujeitos a um patrulhamento ainda mais severo do que o em voga naquela época, que muitas vezes beira o ridículo, como chamar um cidadão brasileiro de "afro-descendente", ou um anão de "verticalmente prejudicado". Palavras e termos usuais como coitado, prostituta, mendigo, drogado, grupo de risco, favela, mulata, também foram "proibidas" pela turminha.
Mas não é engraçado. Hoje, qualquer pessoa que escorregar em uma frase que seja considerada politicamente incorreta pela patrulha ideológica, sofrerá graves conseqüências morais e até mesmo legais.
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