Operação Química
Empresas uruguaianenses envolvidas em desvio de recursos nas Forças Armadas

Polícia Federal, Ministério Público Militar e Exército Brasileiro cumpriram na manhã desta terça-feira, 10/12, seis mandados de busca e apreensão em Uruguaiana e dois em Alegrete, na Operação Química. Aqui, os alvos da ação foram as sedes das empresas Bidinha & Moresco, M.A. Moresco e J.D. dos Santos Rezes, e as casas dos proprietários. Em Alegrete, os alvos foram as sedes da empresa E.R. Comércio
A ação integra uma investigação que apura o desvio de recursos públicos em processo de licitação para aquisição de alimentos e visava coletar provas complementares e que possibilite a identificação de todos os envolvidos e a participação de cada um nos crimes.
De acordo com as autoridades, a investigação está em andamento desde maio de 2018 e até o momento foram identificados indícios de fraude em licitações em 49 quartéis. Embora não haja uma estimativa oficial do montante dos desvios, foram apuradas compras públicas no valor de R$ 25,8 milhões, sendo R$ 23,69 milhões para o Exército, R$ 1,679 milhão para Aeronáutica, e R$ 430 mil para a Marinha.
A investigação teve início depois que um contrato em uma unidade militar de Jaguarão chamou a atenção do órgão. O quartel havia aderido a um contrato para compra de linguiça, já fechado por um dos quarteis de São Borja. O preço estipulado de promotores era de R$ 56 o quilo, sendo que o valor previsto na licitação era de R$ 28, e o preço de mercado, R$ 14. Logo em seguida, o órgão suspeitou da compra de uma tonelada de bife de hambúrguer pelo 25º Grupo de Artilharia de Combate (25º GAC), em Bagé. O produto teria sido entregue em 26 de março de 2019 e, duas semanas depois, em 11 de abril, o MPM vistoriou o quartel e encontrou apenas 50 quilos de hambúrguer, com peso menor por unidade e marca diferente do especificado no edital. Os contratos mantidos pelos investigados para fornecimento de produtos alimentícios possuem indícios de superfaturamento de até 500% em alguns casos.
Ao verificar outros contratos envolvendo unidades do Exército e da Marinha, o MPM identificou que as concorrências eram disputadas quase sempre por apenas três empresas, todas com o mesmo endereço, telefone, e-mail e contador: Bidinha & Moresco, M. A. Moresco e J. D. dos Santos Rezes, sediadas em Uruguaiana.
O vínculo se repetia na sociedade, com um mesmo grupo familiar. A M. A. Moresco pertence a Meireles Alves Moresco Filho, cujos pais, Meireles Alves Moresco e Kátia Lúcia Bidinha, são sócios-administradores da Bidinha & Moresco. Uma ex-empregada de Meireles, Joice Daiane dos Santos, figura como dona da J.D dos Santos Rezes.
Outro indício foi que, em várias ocasiões, os e-mails pedindo reposição nos estoques de comida eram direcionados a Joice, embora a empresa dela não tenha vencido a concorrência e, sim, a empresa da família Moresco.
Ao quebrar o sigilo bancário das empresas, o MPM também descobriu inúmeras transações financeiras entre elas, inclusive com depósitos de cifras superiores a R$ 100 mil. Joice, por exemplo, recebia todos os meses em sua conta-corrente R$ 4 mil da Bidinha & Moresco, "aparentando ser pagamento regular por serviços prestados, embora não seja empregada formal da empresa", diz trecho de uma das denúncias.
O MPM encontrou indícios de oito tipos de fraude, como sobrepreço e direcionamento de licitações, além de crimes como estelionato, lavagem de dinheiro, fraude contábil, formação de quadrilha, falsidade ideológica e corrupção. Por enquanto, foram instauradas duas ações penais, um procedimento investigatório criminal e três inquéritos. O objetivo do MPM é avançar a partir da coleta de documentos e da apreensão dos aparelhos celulares dos suspeitos.
Dois militares lotados no 25º GAC, o terceiro-sargento Maurício Soares Gonçalves e o primeiro-tenente Frede Santana da Silva, foram denunciados por fraude em licitação. Na mesma ação também estão denunciados Joice e Meireles. Os dois empresários foram alvo ainda de denúncia em outro processo, desta vez junto com Sidnei Paulo Radaelli, dono da E. R. Comércio. Eles teriam fraudado licitação para compra de nove toneladas de cebola para quatro quartéis, a R$ 5,73 o quilo. "Em outubro de 2015, mês em que foi realizada a pesquisa de preço com os fornecedores, o quilo da cebola nacional era comercializado na Ceasa por R$ 1,60/kg", diz a denúncia assinada pelo promotor Soel Arpini.
Por meio de notas, as defesas de Meireles Alves Moresco Filho, Meireles Alves Moresco e Kátia Lúcia Bidinha, e de Joice Daiane dos Santos Rezes, negaram as acusações. A família Moresco disse que se sentem como bodes expiatórios ante a ausência de alvos militares, e que "ainda que os nomes dos sérios empresários tenham sido expostos, segue a confiança nas instituições e o avançar das investigações - que optou por devassar suas vidas antes mesmo de colher seus depoimentos - demonstrará sua absoluta inocência". A defesa de Joice disse que a deflagração da operação causa estranheza, pois a empresária já havia sido intimada para prestar esclarecimentos em inquérito policial militar nesta quarta-feira, 11/12, pela manhã.
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